o mar do poeta

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quinta-feira, abril 23

A LENDA DE SURIYOTHAI




Suriyothai (A Lenda de Suriyothai) Chatrichalerm Yukol (2001) Tailândia

Quem gosta de detalhados épicos históricos, tem aqui um filme á medida, pois certamente irá gostar muito de ["Suriyothai"].

Talvez uma das razões porque não há muito mais exemplos deste estilo de cinema na ásia, seja porque é um género bastante dispendioso, afinal estamos a falar de grandes super-produções ao melhor estilo blockbuster de Hollywood e fora dos EUA existem pouco estúdios que possam competir em termos de orçamento com os americanos.
Mas como quem não tem dinheiro de estúdio caça com … monarcas Tailandesas, ["Suriyothai"] não é apenas um filme inesperado por vir de um país que normalmente não associamos a obras cinematográficas relevantes, como ainda por cima deve ser o primeiro blockbuster do mundo a ter sido financiado por uma monarca, pois foi por causa da rainha da Tailândia que este filme foi feito.

["Suriyothai"] é essencialmente um filme de Estado. Foi uma obra encomendada pela monarquia Tailândesa para tentar despertar nas novas gerações o interesse pela história do seu país.
Em vez do governo investir em campanhas promocionais institucionais do estilo “se conduzir não beba”, sua magestade a raínha da Tailândia achou que seria muito mais útil aplicar o dinheiro no Cinema e produzir um filme que fosse suficientemente bom e acima de tudo apelativo junto do grande público como forma de transmitir a sua mensagem, tentando promover o orgulho no passado do seu país e óbviamente promover uma boa imagem da monarquia junto do povo Tailandês.
Como tal o Estado não se poupou a despezas e isso nota-se perfeitamente no ecran durante o filme todo, pois é de uma sumptuosidade e de um detalhe cénico absolutamente espantoso.

A raínha, não se limitando a encomendar e controlar a produção do filme, ainda se deu ao luxo de escolher não só o realizador como também a actriz principal.
Mais precisamente, escolheu a sua secretária particular.
Sim, leram bem.

O papel principal desta gigantesca produção asiática é desempenhado por uma jovem que até então nunca tinha representado na vida e que se viu subitamente o centro das atenções no meio da maior produção cinematográfica asiática de sempre.

Resta dizer que tanto a nova actriz como o realizador têm ligações directas á família real e portanto ["Suriyothai"] é provavelmente o maior filme familiar jamais produzido no mundo.

Isto das cunhas poderia ter sido desastroso, mas no entanto o filme é surpreendentemente bom o que nos leva a concluír que esta raínha não só tem olho para o cinema como ainda por cima parece reconhecer uma boa actriz quando a vê.

Este parágrafo pode conter *spoilers* mas não se preocupem muito com isso pois a força do filme nem sequer está própriamente no seu desfecho previsível mas sim no espectáculo visual que proporciona.

De qualquer forma como habitualmente não contarei muito da história para que a possam descobrir por vós próprios. E acreditem que vão ter muito para ver, pois detalhes de argumento é coisa que não falta nesta super-produção.

["Suriyothai"], conta a história verídica da raínha com o mesmo nome que por volta de 1548 quando o reino do Sião foi invadido pelos Birmaneses, se disfarçou de homem e foi combater no seu elefante junto com as suas tropas, tornando-se uma lenda porque morreu nessa batalha para salvar a vida do marido ao colocar-se entre ele e as tropas birmanesas quando este foi gravemente ferido ajudando a ganhar a batalha e mantendo a identidade do país.
Fim dos *spoilers*

Nota importante: Existem duas versões muito diferentes deste filme.

A versão original com 3 horas e 15 minutos (e que inicialmente tinha 5 horas), realizada e montada pelo seu criador original, Chatrichalerm Yukol e a versão “americana” conhecida como “Francis Ford Coppola presents - The Legend of Suriyothai”, que na verdade é uma nova montagem do mesmo filme com a intervenção do realizador de “Apocalypse Now”.

Coppola, não só cortou uma hora á versão original, como ainda incluiu um par de cenas gráficas novas, (mapas e desenhos), onde se explica em detalhe tudo o que envolve a história do filme de modo a situar as audiências ocidentais no contexto histórico e geográfico da época.

E claro, acima de tudo explicar aos americanos que existe um país no mundo onde não se fala gringo.

É esta segunda versão que foi lançada nos EUA e portanto o único dvd do filme que existe á venda no nosso país é precisamente a edição portuguesa desse ["Suriyothai"], mais reduzido.

E claro que só está editado em Portugal porque tem o nome de Coppola associado á obra.

No entanto temos uma muito boa edição onde nem falta um excelente comentário áudio partilhado pelo realizador Chatrichalerm Yukol e o próprio Coppola que discutem todo o processo de redução do filme e explicam em detalhe a razão de todas as escolhas que foram feitas durante a remontagem do original para criar a versão ocidental. Só por este comentário audio vale a pena adquirirem a versão curta do filme pois dá-nos uma visão muito interessante de como a montagem pode criar dois filmes bastante diferentes com o mesmo material.

Só por curiosidade, o realizador Chatrichalerm Yukol foi colega de Coppola na escola de cinema e daí a razão deste estar ligado agora e este projecto na sua versão ocidental.

Ainda não vi a versão original de ["Suriyothai"], mas já está encomendada e futuramente irei comentar aqui as diferenças entre as duas versões.

No entanto, esta versão ocidental por si só já é um filme extraordinário e que vale mesmo a pena ser visto, não só pelo seu visual absolutamente cuidado, mas por todo o conjunto da obra em geral.

Além disso, se gostam de batalhas épicas envolvendo milhares de figurantes, têm aqui um filme que não podem perder, pois até nesta versão reduzida já vão ter motivos de sobra para ficarem muito impressionados.

Tudo isto sem recurso a CGIs de plástico. Parece que a batalha foi mesmo filmada com a enorme quantidade de gente que poderão ver no vosso ecran o que ainda dá mais valor a esta impressionante produção asiática.

E segundo consta, Coppola até reduziu muito da batalha final nesta versão, pelo que se quiserem mesmo vê-la como esta foi filmada terão de comprar o filme original.

Mas nem só de batalhas épicas vive esta obra. Na verdade o filme não é própriamente um filme de acção Wuxia, por isso não esperem ver muitas cenas do estilo até á batalha final.

Nas mais de duas horas de duração que a versão ocidental de ["Suriyothai"] tem, pelo menos uns 110 minutos são passados num estilo biográfico, com uma narrativa de contornos históricos que agradará imenso a quem gosta de intrigas políticas, manobras de bastidores e traições ao melhor estilo de um drama Shakespeareano.

Mas não pensem que se irão aborrecer particularmente, embora o filme tenha umas quebras narrrativas estranhas, mas que naturalmente serão consequência da sua redução face á duração original.

["Suriyothai"], contêm suficientes pormenores, personagens e detalhes cénicos para manter o espectador ocupado a admirar quanto mais não seja, a beleza e o cuidado colocado em cada fotograma deste filme. Isto, obviamente se entrarmos no filme sabendo logo á partida que não vai ser um filme de aventuras ou de acção, mas sim um drama político e histórico que por acaso até tem uma sequência de batalha espectacularmente elaborada no final.

Contém bons personagens e excelentes actores com destaque para a inexperiente actriz que carrega nos ombros o papel principal e que na verdade se sai tão bem que ninguém diria que nunca tinha estado em frente a uma câmera de filmar antes de embarcar nisto.

Além disso é um filme muito realístico no que toca a sequências que podem impressionar o público mais sensível. Não tem problemas em entrar pelo gore e baldes de sangue nas cenas que pedem um tratamento desse género e contém uma cena verdadeiramente repugnante a propósito de uma epidemia da varíola quando a certa altura do filme este pormenor nos é mostrado o quanto podia ditar o destino político de um país.

Mas uma das coisas mais curiosas, especialmente para nós, é a constante presença de Portugueses neste filme Tailandês.

Exactamente, Portugueses num filme Tailandês, passado em 1548 no reino de Sião, antigo nome da Tailândia.

Há portugueses por todo o lado, discretamente introduzidos neste filme e raramente Portugal teve uma imagem tão positiva numa produção cinematográfica estrangeira como tem neste ["Suriyothai"].

Não há nenhum personagem Português no filme com papel de destaque, ou sequer algum diálogo, mas enquanto figuração todo o background está cheio de compatriotas nossos, retratados como comerciantes, médicos, exploradores, soldados, e até como voluntários que no final combatem do lado dos herois contra os invasores birmaneses.

Além disso a presença de Portugal no reino de Sião é referida um par de vezes nos próprios diálogos dos personagens principais e toda a nossa imagem é a mais positiva possível, o que me leva a concluir que pelo visto deixamos muito boa impressão na Tailândia. Tão boa, que a raínha actual permitiu que se incluissem aquelas referências no argumento.

Mas é muito estranho e ao mesmo tempo engraçado.

Estamos a ver um filme oriental, cheio de orientais, de repente passa um Português pelo cenário.

Pelo visto a produção conseguiu arranjar uns portugas para fazer figuração no filme, pois por incrível que pareça, aquelas pessoas se não são de verdade Portugueses, pelo menos parecem e já é bem mais do que podemos dizer da maneira como costumamos ser retratados em produções americanas onde nos confundem sempre com mexicanos.

Por tudo isto, ["Suriyothai"] é não só um excelente filme histórico como ainda por cima tem uma das melhores batalhas que poderão ver no cinema contemporaneo.
Pode ser um filme propaganda do sistema político Tailandês, mas como cinema é um dos melhores épicos que poderão encontrar á venda actualmente.

(Artigo extraído do site cinema asiatico wordpress)

À estreia deste filme na cidade de Bangkok esteve presente o apresentador de televisão, em Portugal, Carlos Cruz.





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